Aurelio Rojas, cardiologista: "Este medicamento não só não protege, como em alguns casos pode até fazer mal."
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Durante 40 anos, acreditou-se que os betabloqueadores eram essenciais após um ataque cardíaco. Eles eram considerados um escudo para prevenir novos ataques e proteger o coração. No entanto, as evidências científicas acabaram de tomar um rumo inesperado. Um estudo publicado recentemente no prestigiado New England Journal of Medicine mostra que esses medicamentos não só não oferecem benefícios em alguns pacientes, como podem até ser prejudiciais.
O cardiologista Aurelio Rojas explicou isso em um vídeo recente. "Este medicamento não só não protege, como em alguns casos pode até prejudicar", afirma. Suas palavras se referem a um estudo internacional liderado na Espanha pelo Centro Nacional de Pesquisa Cardiovascular (CNIC), conhecido como ensaio REBOOT, que envolveu mais de 8.500 pacientes de 109 hospitais.
@doctorrojass Esta NOTÍCIA mudou a CARDIOLOGIA?: A maioria das pessoas que tiveram um ataque cardíaco e continuam a tomar betabloqueadores... não precisam deles. Na Espanha, estima-se que mais de um milhão de pacientes. Quão verdadeiro isso é? Um macroestudo liderado pelo CNIC e publicado no New England Journal of Medicine deixa claro: O uso indiscriminado de betabloqueadores após um ataque cardíaco não faz mais sentido em todos os pacientes. As novas evidências diferenciam três grupos: 1️⃣ Função normal: evite-os (risco > benefício). 2️⃣ Função ligeiramente reduzida: mantenha-os (benefício claro). 3️⃣ Insuficiência cardíaca ou FE gravemente reduzida: essencial. Centenas de pessoas convivem com fadiga, tontura ou disfunção sexual devido a um tratamento que, de acordo com as evidências atuais, nem sempre é necessário. Meu conselho: - Não interrompa o tratamento por conta própria. - Revise seus relatórios e procure a frase: "fração de ejeção preservada". - Se aparecer, converse com seu cardiologista: interromper os betabloqueadores pode ser a opção mais adequada para você. A ciência não erra ao se corrigir: ela evolui. E esse avanço pode melhorar a qualidade de vida e a segurança de milhares de pessoas. Digo isso porque vejo isso todos os dias no coração. REF: 1. Rosselló X, Prescott E, Kristensen AM, Ibáñez B, et al. β-bloqueadores após infarto do miocárdio em pacientes sem insuficiência cardíaca. N Engl J Med. 2025. 2. Atar D, Prescott E, Kristensen AM, Ibáñez B, et al. BETAMI–DANBLOCK: β-bloqueadores após infarto do miocárdio com FEVE ≥40%. N Engl J Med. 2025. 3. Rosselló X, Prescott E, Kristensen AM, Ibáñez B, et al. Betabloqueadores após infarto do miocárdio com fração de ejeção levemente reduzida: meta-análise de REBOOT, BETAMI, DANBLOCK, CAPITAL-RCT. Lancet. 2025. #betabloqueadores #infarto #notícias #saúde #coração ♬ som original - Aurelio Rojas Sánchez
Os resultados do estudo são claros: em pessoas que sobreviveram a um ataque cardíaco e mantiveram a função ventricular normal — ou seja, com a força cardíaca preservada — o tratamento com betabloqueadores, como bisoprolol, nebivolol ou carvedilol , não melhora os resultados dos pacientes. Não reduz a mortalidade nem as readmissões hospitalares. E, o mais impressionante, no caso das mulheres, aumenta o risco de sofrer outro ataque cardíaco, desenvolver insuficiência cardíaca ou até mesmo morrer.
Rojas resume de forma instrutiva: quatro décadas atrás, a situação era muito diferente. A maioria dos pacientes que sobreviviam a um ataque cardíaco ficava com o coração gravemente danificado e, nesse contexto, os betabloqueadores demonstraram reduzir a mortalidade. Mas hoje, a situação mudou graças aos avanços da medicina. O desenvolvimento do "código do ataque cardíaco", a reperfusão precoce e a angioplastia permitiram que aproximadamente 70% dos afetados mantivessem seus corações em condições normais após o evento.
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A chave é diferenciar entre dois cenários. Quando o coração está enfraquecido, há insuficiência cardíaca ou ocorrem arritmias, os betabloqueadores continuam sendo um tratamento seguro e útil. Mas se o paciente tiver uma fração de ejeção preservada — ou seja, um coração que bate com força normal — os medicamentos não oferecem nenhum benefício e podem ser desnecessários ou prejudiciais.
O próprio especialista explicou: "Se você teve um infarto, revise seus laudos e veja se eles indicam 'fração de ejeção preservada ou normal'. Nesse caso, consulte seu cardiologista, pois interromper o uso pode ser a melhor opção", acrescentou. No entanto, Rojas insiste que não se trata de abandonar a medicação sem supervisão. A decisão deve ser sempre individualizada e orientada por um médico, pois cada coração responde de forma diferente.
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O impacto do estudo é significativo, pois questiona uma recomendação que moldou a prática clínica por décadas. No entanto, o cardiologista ressalta que essa evolução faz parte do processo natural da ciência. "A ciência não erra quando se corrige; ao contrário, ela evolui e se aprimora", afirma. Cada ensaio clínico acrescenta nuances e permite que os tratamentos sejam adaptados às realidades atuais dos pacientes, que não são mais os mesmos de quarenta anos atrás.
A mensagem final é clara: não existe um modelo único para o coração após um infarto, e a medicina deve se adaptar a cada caso. Longe de ser um fracasso, as novas evidências abrem caminho para um tratamento mais personalizado e eficaz.
O estudo REBOOT é um exemplo de como os avanços médicos forçam a repensar dogmas. Graças à melhoria dos tratamentos de emergência, a maioria dos pacientes não se enquadra mais no perfil para o qual as terapias foram concebidas na década de 1980. Isso explica por que um medicamento que salvou vidas naquela época pode ser desnecessário hoje para um grande grupo de pessoas.
El Confidencial